31-08-2020, 11:33 AM
(Esta publicação foi modificada pela última vez: 31-08-2020, 11:33 AM por Guardião.)
[Os Doze Trabalhos] O Sétimo Trabalho: O Touro de Creta
por DiomedesRJ
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O mar da Grécia enchia o nariz de Hércules com o seu odor, enquanto seu pequeno barco o guiava à caminho do Sétimo Trabalho.
Desta vez, o Arauto de Euristeu o remeteu para a Ilha de Creta, onde dizia-se que um enorme touro branco pertencente ao Rei Minos, tinha se tornado furioso e passado a ameaçar vilas e aldeões. Sua missão era trazer o touro vivo até Micenas, para que Euristeu desse a ele o fim que desejasse.
Em seu quarto, pouco depois da partida de Hércules, Euristeu ainda lá estava, apavorado. Juno havia aparecido novamente a ele em sonho, como aquele enorme pavão de olhos de fogo, desprezando-o pelo Filho de Júpiter ainda estar vivo, e anunciando, logo após dizer a seu servo qual seria o próximo Trabalho de Hércules, que agora, ela iria pessoalmente garantir que ele falharia, daqui por diante.
De volta para o semideus, à medida que se aproximava de Creta, o tempo se tornava mais escuro e fechado. Nuvens pesadas e baixas cercavam gradualmente a ilha, como um grande manto cinza-chumbo que caía sobre ela. Quando enfim aportou no Reino de Minos, o dia tinha se tornado noite.
Umas poucas tochas que insistiam em se manter acesas apesar do vento frio, eram as únicas indicações de como chegar até o Palácio de Creta. As ruas desertas, e uma trilha feita de patas enlameadas, madeira estilhaçada, e sangue, cruzando a avenida de cima, até embaixo, mostravam que o Touro havia estado ali há pouco.
Em meio ao caminho, porém, uma voz firme o adverte:
– Você não precisa ir até o palácio, Filho de Júpiter. Minos já declarou que qualquer um que submeta o Touro poderá ficar com ele, embora matar o animal seja punido com a pena de morte. O sangue dos últimos que tentaram ainda está no chão das ruas próximas.
Hércules vê um jovem de corpo bem cultivado, mas de pernas quebradas e mal curadas, lançado a um canto, com uma cuia e uma esteira, denunciando sua condição como um mendigo.
– E quem é que me concede esse conselho tão oportuno?
– Sou Tauro. Fui um criado do Rei Minos, aquele encarregado de cuidar do animal. Se puder me dar algumas moedas, ou ao menos, repartir seu pão comigo, lhe contarei o que sei sobre o Touro Branco.
Após se sentar, repartindo a esteira, seu pão, e uns goles de vinho com o mendigo abandonado, ele lhe contou.
– O animal é fonte de desgraça desde que chegou, Hércules. O Touro foi um presente de Netuno, Deus dos Mares, para o Rei. Eu estava presente quando o animal emergiu do mar em meio a uma cerimônia. No mesmo dia, eu, que sempre cuidei do rebanho real, fui destacado para cuidar exclusivamente dele, até o dia de seu sacrifício.
Ele sempre foi um animal imponente, mas perfeitamente dócil. Cuidei dele, e de todas as jóias e pedrarias com o qual ele foi enfeitado, com o melhor das minhas habilidades. Mas no dia marcado para seu sacrifício, o Rei em pessoa me procurou dizendo que meu ofício agora seria permanente.
– Então, Minos renegou um sacrifício aos Deuses… – disse Hércules, meneando a cabeça.
– Sim. Até então, tudo corria bem. O animal recebia muitas visitas, e era exibido publicamente algumas vezes. Mas ele começou a receber uma visita cada vez mais frequente… a da Rainha, Pasifaé.
Eu a vi à distância, e via o jeito que ela olhava… falava… acariciava o Touro. No início, achei que estava divagando de forma maldosa. Até que fui dispensado do meu ofício por um dia inteiro. Desconfiei, e observei de longe. E eu vi.
Vi uma vaca de bronze, um engenho mecânico como nunca vi antes, ser trazido até a baia onde o Touro vivia. Não sei como ou de que forma exatamente, o Touro Branco a cobriu como se fêmea fosse. No fim do dia, os criados levaram o mecanismo para longe, ele se abriu e…
– E…
– A Rainha saiu de dentro dele. Suada, sorrindo, e com as pernas trôpegas. A própria Rainha fornicou com o presente divino…
No dia seguinte, o Touro Branco havia mudado. Estava raivoso e arisco. Soube que meus auxiliares tiveram medo de lidar com ele, e entrei na baia.
Tauro aponta para as próprias pernas e diz tristemente:
– Ele arrancou contra a porta e contra mim. Saí no último instante, mas ele me pisoteou mesmo assim. Se não tivesse saltado, meu corpo teria sido destruído por ele. O Touro Branco demoliu todas as cercas, e passou a desfechar a desgraça que caiu sobre o povo.
– E quanto a Família Real? – perguntou Hércules.
– O Rei me perguntou o que houve. Contei tudo a ele. No dia seguinte, outros criados me pediram sinceras desculpas, e me trouxeram de maca até aqui, onde estou até hoje, dizendo que o Rei me punirá de morte se eu contasse a qualquer aldeão o ocorrido. A bondade do povo tratou minhas feridas, mas agora, não passo de um aleijado inútil, vivendo da bondade e dos restos do Palácio. Quanto a Minos, nada sei, além do decreto, e que ninguém mais viu a Rainha depois da fuga do Touro.
– Não teme pela sua vida, nobre Tauro?
– Não. Você não é um aldeão, afinal de contas – disse Tauro num arremedo de sorriso – Me ouça, o Touro sempre vai ao mesmo lugar à noite, muito embora agora, com essas nuvens todas, o dia e a noite sejam uma coisa só. É uma construção ainda incompleta, no Sul da ilha. Os que a viram falam de vários corredores e paredes feitas à esmo. Alguns já foram até lá, mas temo que se perderam, pois jamais voltaram.
– Eu lhe agradeço então, pela história, Tauro. E se me permitir, pernoitarei com você hoje.
Hércules contou sobre alguns de seus Trabalhos anteriores para o mendigo, até que o vinho e o sono os fizeram adormecer. Quando Tauro acordou, Hércules já estava pronto para partir, de pé, e dizendo:
– Mantenha seus olhos no porto, Tauro. Pois me verá deixar Creta com o Touro, exatamente por ali.
Antes de descer de volta para a estrada, Hércules enunciou:
– Que os Deuses te acompanhem.
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O Filho de Júpiter seguiu até o Sul da ilha, como Tauro lhe instruiu, até chegar ao estranho local de construção que ele citou.
Umas poucas áreas cobertas, entremeadas de colunas sustentando o nada, e paredes desconexas cobriam vasta porção da terra. O material disperso indicava mesmo que se tratava de construção incompleta, e agora, abandonada. Da mesma forma, as pegadas frescas do Touro, mostravam que ele havia entrado ali, embora a partir de certo ponto, o chão já coberto não denunciasse seu caminho.
Hércules olhou para aquele Labirinto incompleto, e sabia que entrar a esmo só o faria se perder, e talvez, ser pego de surpresa pelo Touro. Sem uma referência, seria suicídio.
Após um pouco de reflexão, Hércules enfim entendeu o que era necessário.
Jogou sua tocha ao chão, deixando que a lama a apagasse. E na mais absoluta escuridão, passou a procurar.
Após algum tempo, o negrume da tempestade que não caía, lhe mostrou. Um ponto de luz, firme como o de uma estrela, estava afastado mas alcançável. Usando a luz como referência, Hércules trafegou por entre as paredes, elevando-se onde era possível, para saber para que lado continuar seguindo.
Após algum tempo, ele podia ouvir um bufar muito próximo, como se estivesse ao seu lado. Era hora de combater.
O Filho de Júpiter virou-se já em corrida, e na primeira curva, viu o Touro e o diamante encrustado em sua testa, perto demais e surpreendido demais para investir. Tomando-o pelos chifres, e depois pelo pescoço, lançou a cabeça do Touro Branco ao chão, forçando-o a ajoelhar. Apenas mantendo-o no chão com sua poderosa força, o semideus disse: “Não vim te ferir ou de ti abusar, Divina Oferta. Também ofertei minha vida em sacrifício. Não tenho medo, e você não deve temer, também.”
O Touro, se acalmando aos poucos, forçou seu pescoço cada vez menos contra Hércules, até se aquietar de vez. Mantendo-o seguro por um dos chifres, Hércules o acariciou por uns momentos, até montá-lo, e dizer: “Está na hora de deixarmos esse lugar de miséria e confusão. Juntos.”
Hércules tocou o Touro em linha reta, fazendo com que as forças deles somadas, derrubassem muros e colunas, até ambos estarem fora do Labirinto.
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Tauro sorriu quando, do alto da escadaria, viu um homem fortíssimo montado sobre um Touro Branco, entrar no mar e nadarem rumo ao continente. Sorriu novamente quando viu o Sol começar a aparecer entre as nuvens. Ajeitando seus parcos pertences, achou o alforje de Hércules com uma porção generosa de suas moedas, e uma mensagem: “Conheci um médico com poderes quase divinos, quando retornava da luta contra a Hidra. Seu nome é Esculápio. Use o dinheiro para alugar um barco e depois uma carroça. Viaje até Epidauro e o procure. Se alguém pode devolver sua saúde, é ele. Cure-se e viva em paz.”
O terceiro sorriso de Tauro foi o mais largo de todos.
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Diante do seu altar particular à Hera, Euristeu nunca foi tão vacilante.
– Se-Se-Senhora do Mundo, Hércules logrou êxito no Sétimo Trabalho. O Touro Branco já está em Micenas. O darei em sacrifício a você, amanhã pela manhã, em sua honra e glória.
Os olhos do pavão de pedra brilharam como rubis, até que ele ouviu:
– IMBECIL!!!
Euristeu caiu de joelhos imediatamente enquanto ouvia a Deusa falar:
– Sacrificar um animal que meu odiado enteado recuperou, significaria dar honra e glória A ELE! E isso é a última coisa que eu desejo! É com essa idiotice que você recompensa quem lhe deu seu Reino? Seu trono? Seus bens? Quem lhe deu TUDO???
O Rei de Micenas apenas abaixou sua cabeça em temor.
– Liberte o animal. Agora ele é manso, embora ainda selvagem. Que outros deem a ele o destino que lhe aprouver. E agora levante-se, Servo. Tenho outro Trabalho que você deve transmitir ao odiado filho de meu amado marido…
Não deixe de ler a explicação do mito no próximo artigo!
Esse tópico é um oferecimento do Guardião e as Relíquias Perdidas.