24-07-2024, 06:03 PM
(30-06-2024, 06:30 PM)Vital Escreveu: Agora estou lendo este livro:
https://archive.org/details/concepto-cri...t/mode/2up
Acabei de ler este livro. Este livreto reproduz uma palestra do Visconde de Santa Clara de Avedillo, José de Yanguas y Messía, distinto combatente católico do século XX. Seu conteúdo versa sobre a propriedade privada, geradora de direitos e deveres para quem a detém, conforme os ensinamentos da Igreja Católica.
É importante tratar desse assunto, porque alguns fiéis deixam-se influenciar pelo liberalismo e ficam surpresos quando descobrem que o direito à propriedade não é absoluto – algo que a Santa Igreja ensina há séculos. Eu poderia citar várias encíclicas, mas desta vez prefiro comentar essa conferência, intitulada "Conceito cristão de propriedade".
A conferência ocorreu no auditório da Real Academia de Jurisprudência e Legislação. Superada a parte introdutória, Yanguas Messía começou por lembrar aos presentes que Deus espalhou riquezas pela Terra para que elas servissem às necessidades da humanidade – a chamada destinação universal dos bens. É fato que as ideologias socializantes tiram proveito desta verdade para legitimar suas pautas, mas tais pretensões não resistem a um confronto com o Magistério da Igreja, que teve a sabedoria de condicionar os direitos dos particulares às exigências do bem comum, atribuindo ao Estado a missão de arbitrar conflitos e intervir na ordem econômica em defesa dos interesses nacionais.
Por estar subordinado ao bem comum, o direito à propriedade não é absoluto, como imaginam os prosélitos do liberalismo. Acontece que nem sempre é fácil definir quando e como este direito deve sofrer restrições. Yanguas Messía classificou-as em três categorias: limites de caráter econômico, jurídico e moral.
Limites de caráter econômico são aqueles destinados a coibir práticas prejudiciais ao funcionamento do organismo nacional – especulação, usura, cartelização, etc. Ao detectá-las, "o Estado tem de igual modo não só o direito, mas o estrito dever de atacar a enfermidade social". Um exemplo remoto pode ser encontrado nos decretos papais que autorizavam qualquer cidadão romano a cultivar terras alheias sem permissão do proprietário se elas estivessem ociosas, desde que o governo assim consentisse. O autor observa que os primeiros éditos desse teor foram expedidos por Clemente IV no século XIII e Sisto IV no século XV – 1474, para falar com exatidão. Acrescento eu que outros papas renovaram a disposição acima, alterando detalhes sem mexer na essência: Clemente VII, em Motu proprio datado de 27 de fevereiro de 1524, São Pio V, na bula 'Statuta nobilis artis Agriculturae', de 18 de setembro de 1566, Pio VI, em Motu proprio de 25 de janeiro de 1783, e Pio VII, em Motu proprio de 4 de novembro de 1801.
Os limites de caráter jurídico são aqueles ditados pelas necessidades da sociedade e doutros indivíduos. Na primeira modalidade entram as nacionalizações, geralmente feitas no interesse da segurança nacional ou por conta de eventos excepcionais, como calamidade pública. Em todo caso, manda o direito natural que o proprietário seja indenizado pelo governo. A segunda modalidade contempla situações em que é lícito requisitar a propriedade alheia para salvaguardar a vida humana. A prestação de socorro aos náufragos seria uma delas, pois em tal circunstância um navio particular pode ser tomado, usado no resgate e depois devolvido, sem que se configure qualquer injustiça.
Por fim, os limites de caráter moral são os mais importantes. Sobre a necessidade de impô-los não paira dúvida nem controvérsia. Compete à autoridade pública zelar para que não se faça da propriedade qualquer uso imoral – como sucede na produção televisiva, na fabricação de trajes femininos, nas casas de jogatina. A necessidade de repressão será tanto menor quanto mais católica for a população, pois quem assimila os valores cristãos faz deles sua norma de ação.
Como vocês podem ver, não existe a menor compatibilidade entre a filosofia liberal e a moral católica, porque esta se orienta para finalidades muito mais elevadas – na Terra e no Céu. Ela está separada do liberalismo por um fosso tão grande quanto aquele que separa o código da Nobreza da lógica do mercador.